sexta-feira, 24 de abril de 2009

Marco Aurélio Mello: É preciso virar essa página


















A discussão entre o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, e ministro Joaquim Barbosa, evidenciou divergências pessoais e de idéias na mais alta Corte do país. Muitos saíram publicamente para classificar os culpados na briga. Mas o ministro já busca colocar panos quentes. Magistrado do Supremo desde 1990, ele fala a Terra Magazine de cara: "Eu não procuro um culpado pelo episódio".
- O que ocorreu foi um extravasamento dos dois, do que é esperado de um colegiado julgador, os quais devem discutir idéias, sem descambar, como o ocorrido, para o campo pessoal - avalia o ministro.

Marco Aurélio explica que o descompasso entre eles "vem de discussões outras". E acredita que, daqui para frente, "tomaremos mais cuidado na veiculação de nossos pensamentos e convencimentos sem buscar desqualificar o colega".

Para o magistrado, o bate-boca entre os ministros é proveniente de "discussões da segunda turma de habeas corpus envolvendo o antigo controlador do Banco Santos, discussão também envolvendo a operação Anaconda". Segundo aconselha o ministro que já presidiu a Casa de 1996 a 1997, é preciso "virar esta página".

Cauteloso, Marco Aurélio Mello tece sua avaliação sobre o atual presidente do STF. Afirma que se pronunciar sobre problemas em setores diversos "acaba expondo a imagem do Supremo". Mas contemporiza: "Hoje, talvez, ele esteja mais convicto de que é preciso se resguardar um pouco mais".

Bastante crítico à postura dos integrantes do STF, Marco Aurélio recomenda, "autocrítica para todos os integrantes do Supremo, inclusive Mendes e Barbosa".

- É hora de nós buscarmos uma austeridade maior e pronunciamentos, principalmente o presidente do Supremo, sobre questões em que o pronunciamento seja necessário.

Questionado se já teria falado com um dos ministros, Marco Aurélio revela:

- Falei com o ministro Gilmar Mendes pelo telefone no dia seguinte e disse para ele que a sensação era de ter bebido todas na noite anterior.

Leia na íntegra a entrevista com o ministro da Justiça, Marco Aurélio Mello:


Terra Magazine - O senhor acredita que o episódio tenha sido reflexo da postura adotada pelo presidente do Supremo?
Marco Aurélio Mello - Eu não procuro um culpado pelo episódio. O que ocorreu foi um extravasamento dos dois, do que é esperado de um colegiado julgador, os quais devem discutir idéias, sem descambar, como o ocorrido, para o campo pessoal. Na verdade, o descompasso entre eles vem de discussões outras. Acredito que, daqui para frente, tomaremos mais cuidado na veiculação de nossos pensamentos e convencimentos sem buscar desqualificar o colega. Cheguei a ouvir manifestações do ex-presidente Maurício Corrêa em que sugeria a edição das sessões antes que fossem veiculadas pela TV Justiça. Isto seria um retrocesso, em minha opinião. A TV Justiça funciona como um controle externo indireto. Veja o caso. Por isso os ministros tiveram que buscar o equilíbrio e enfrentar a problemática.

Quais "discussões outras"?
Discussões da segunda turma de habeas corpus envolvendo o antigo controlador do Banco Santos, discussão também envolvendo a operação Anaconda, que não foi comigo como o ministro Joaquim Barbosa afirmou pois não integro a segunda turma. Foi com o ministro Gilmar Mendes. Precisamos virar esta página. Esquecer certas desavenças e buscar a melhor atuação possível para atender à sociedade.

Os críticos do presidente do STF afirmam que muitas vezes ele faz declarações na mídia sobre o mérito de processos ainda em andamento no Supremo. Acredita que isto seja um fator que atrapalhe o bem estar entre os magistrados?
Ele não se pronuncia sobre questões em andamento. O que ele tem feito de uma forma geral é se pronunciar sobre problemas em setores diversos. Hoje, talvez, ele esteja mais convicto de que é preciso se resguardar um pouco mais. Porque, toda vez uma pessoa que se pronuncia, ela vai para uma vitrine e fica sujeita aos segmentos incomodados com o dito. Não acredito que este seja um fator que cause mal estar entre magistrados, contudo acaba expondo a imagem do Supremo. É hora de nós buscarmos uma austeridade maior e pronunciamentos, principalmente o presidente do Supremo, sobre questões em que o pronunciamento seja necessário.

A discordância explicitada é reflexo do embate profundo também no campo pessoal. Na opinião do senhor qual a austeridade possível de se buscar depois de uma briga destas? Ela será natural, quais os efeitos?
É preciso que haja o que eu chamo de tratamento cerimonioso entre os ministros. E também discutir de forma elevada os temas que se apresentem ao Supremo. Discutindo sempre nas sessões do plenário e das turmas. Deve vingar principalmente um princípio básico na administração pública: a impessoalidade. Isto, porque estamos em cargos que deixaremos. Já as instituições, elas permanecerão. Isto é fundamental para o fortalecimento da democracia.

Algumas pessoas, assim como o ministro Joaquim Barbosa, afirmam que o presidente do STF tem "arranhado" a imagem do Supremo. Gilmar Mendes nega. O que o senhor pensa sobre a imagem do STF, como melhorar?
Não é hora de buscar culpado, mas a correção de rumos. Para isto, é preciso autocrítica, para todos os integrantes do Supremo, inclusive Mendes e Barbosa.

Como arrumar esta imagem do Supremo?
Precisamos otimizar o tempo. Sou um inconformado com os atrasos das sessões. Como se nós não tivéssemos um resíduo de processos. Muito pelo contrário, temos entorno de 600 processos aguardando pregão no plenário. Precisamos realmente observar o espaço de intervalo e evitar discussões paralelas que não dizem respeito ao caso concreto. Com isto, estaremos atendendo aos anseios da sociedade e jurisdicionados.

A nota de apoio emitida em favor do presidente do STF foi uma maneira de demonstrar que não existe crise no Supremo?
A nota de apoio visou demonstrar que continuamos confiando no desempenho institucional do ministro Gilmar Mendes, porque o ministro Joaquim Barbosa afirmou que o presidente estaria levando o Judiciário ao descrédito. Nós não chegamos a pensar assim. Sim, entendemos que ele deva retirar o pé do acelerador, para usar uma gíria carioca, mas nós não chegamos à crítica de que ele esteja afundando o judiciário. A nota não conteve qualquer censura ao ministro Barbosa, ao contrário do que uma ala do tribunal queria. Se fizéssemos uma crítica, abriríamos margem para qualquer cidadão representar ao Senado da República, objetivando impeachment do ministro Joaquim Barbosa.

Chegou a conversar com algum dos dois depois do ocorrido?
Com o ministro Joaquim só mantenho relações funcionais nas sessões porque já tivemos desavenças e eu esperei por uma retratação da parte dele, o que não aconteceu. Falei com o ministro Gilmar Mendes pelo telefone no dia seguinte e disse para ele que a sensação era de ter bebido todas na noite anterior.

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