quinta-feira, 30 de julho de 2009

Vamos entender melhor esse jogo de hipocrisias na campanha contra José Sarney.

1. A Folha traz uma denúncia de empréstimos do BNB (Banco do Nordeste do Brasil) à TV Mirante, dos Sarney. A dívida está sendo questionada na Justiça, devido às cláusulas de correção cambial. O empréstimo foi concedido pelo BNB na gestão Byron, indicado pelo senador Tasso Jereissatti e homem de confiança do Ministro da Fazenda Pedro Malan. Questionamento na Justiça significa o banco contra Sarney, não necessariamente irregularidades cometidas na concessão do empréstimo.

2. Todos esses vícios de Sarney fazem parte de usos e costumes do Legislativo. Praticamente todos os senadores foram beneficiados por nomeações de parentes e outras benesses do poder. Mas a campanha é focada nele, não nas saídas para reduzir esse tipo de vício das práticas políticas brasileiras.

3. O governo Sarney marcou o auge do poder de Roberto Marinho. Não havia uma indicação de Ministro que não passasse por Marinho, conforme amplamente conhecido. Foi nesse período que a TV Mirante, de Sarney, conseguiu a concessão da Globo (assim como a TV de ACM). E a Globo conseguiu apoio irrestrito da Telebras.

4. No governo Sarney, a Folha se aproximou dele de tal maneira que lhe concedeu vinte anos de coluna no espaço nobre da página 2.

5. Agora que José Sarney ameaça renunciar, matéria da Folha mostrando a cúpula tucana (FHC, Serra e Aécio) tentando se aproximar dele. Renunciando, os ataques contra ele cessarão na hora, como cessaram contra Renan.

6. Em sua coluna de hoje, Clóvis Rossi fala em “um certo estilo de Máfia”. Coloco o raciocínio do Rossi, deixando entre parêntesis opções de personagens que se adequam ao raciocínio.

“O problema é que Renan (a mídia) não ameaça Virgílio (Sarney) porque este violou a ética, mas porque o PSDB (PMDB) está entrando com a sua própria representação (aliança) contra José Sarney (José Serra), de quem Renan (a mídia) é cão de guarda. Em outras palavras, é o típico aviso mafioso: você não entra no meu território que eu deixo seus trambiques em paz”.



Estas campanhas falsamente moralistas são um desserviço para a política brasileira.

Não se discute o sistema, mas os personagens, porque é mais fácil novelizar, romantizar e vender manchetes além, lógico, de facilitar a escolha de mocinhos e bandidos, que como veremos é o que mais interessa.

Ou seja: transforma-se uma questão sistêmica em questão moral. Faz-se acreditar que “se fossem outros” não aconteceria o mesmo, e mesmo que aconteça (como neste caso o Arthur Virgílio) minimiza-se porque não se enquadra na novela que se quer constituir.

Se analisássemos o sistema politico brasileiro, veríamos as interrelações entre as instituições públicas e privadas, incliuindo a midia, as relações entre os poderes, as relações entre os partidos, grandes e pequenos, as funções que cada personagem deve desempenhar para que seja um elemento-posição do sistema.

Veríamos que teríamos muito o que corrigir, para levar este país à maturidade política, à racionalidade administrativa.

Mas não. Isso não importa, porque acabaria com oportunidades “interessantes” no futuro.

Em relação aos jornalistas, temos nas redações dois tipos de profissionais: aqueles mais hábeis, frequentadores assíduos do aquário, sabem perfeitamente que estão fazendo parte do jogo, que estão novelizando o caso, porque lhes interessa.

E temos uma mão de obra de cabresto, com muita dificuldade de enfrentar uma análise mais complexa. O déficit de informação é evidente e mostra porque a maioria dos jornalistas tem enorme dificuldade de efetuar uma avaliação mais distanciada, mais racional de todo este processo.

O desserviço está no fato de que enquanto se discutem estas questões pelo ponto de vista moral, deixa-se de discuti-las sob embasamento técnico, político-administrativo, o que levaria o país a superar tais problemas.

Em outras palavras: não se discutem os modos de correção do sistema, porque interessa àqueles - incluindo a grande imprensa - que praticam o falso moralismo usufruir do sistema num futuro que se espera próximo.

Em suma, parodiando Nelson Rodrigues, o moralismo é a último refúgio dos canalhas.

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